Logo no início da implementação do projeto, um grande empecilho foi a dificuldade em dar início ao processo de revalidação de diplomas. Isso porque as universidades solicitavam muitos documentos e estes deveriam estar consularizados. Contudo, a pessoa que se encontra em situação de refúgio não tem tempo hábil para organizar todos os documentos e decidir mudar de país, ela foi obrigada a fugir de seu país de origem por fundado temor de perseguição, e precisou fugir às pressas em busca de proteção. Desta forma quase nenhum dos nossos atendidos possuía todos os documentos, tampouco sua consularização.
Um caso muito impactante foi de um jovem sírio, que tinha vindo para o Brasil e buscado refúgio por ser considerado um desertor – ou seja, ele se negou a participar da guerra. Por isso, neste caso, conseguir mais documentos ou levá-lo ao consulado no Brasil para legalizar tais documentos não era uma opção! E por ele não possuir toda a documentação necessária, com as devidas regularizações consulares, diversas universidades sequer aceitaram protocolar seu processo de revalidação de diploma.
O processo de revalidação de diplomas de graduação no Brasil só pode ser realizado em universidades públicas – o que limita a quantidade de revalidações. Além disso, cada processo depende das regras de cada curso e de cada universidade: por exemplo, não havia um padrão de documentos solicitados, de valores cobrados e um prazo razoável para sua conclusão, além da necessidade de investir recursos financeiros para a tradução juramentada. Dessa forma, todo o procedimento tornava praticamente inacessível o acesso dos solicitantes de refúgio e refugiados ao reconhecimento de seus diplomas no Brasil.
Em junho de 2016 surgiu a Resolução Normativa no 3 do Conselho Nacional de Educação, que trouxe uma uniformidade ao processo de revalidação de diplomas e facilitou o processo para refugiados reconhecidos pelo CONARE, que não possuem toda a documentação e que não tivessem tais documentos consularizados. Esta resolução deu a oportunidade destas pessoas, em situação de refúgio, de realizarem uma prova para análise de seus conhecimentos e, no caso de sua aprovação, ter seu diploma revalidado.
Já em dezembro de 2016, saiu a Portaria Normativa do MEC no 22, que é utilizada até hoje como norma que regulamenta a revalidação de diplomas no Brasil e com base nestas normas, as universidades puderam refazer suas resoluções internas de revalidação de diploma.
Devido essa mudança normativa (que regulamentou todo o processo de revalidação de diplomas no Brasil) ser recente, as universidades buscaram se adequar, e por esta razão muitas suspenderam o processo de revalidação, até março de 2017. Por vários meses, entre o final do ano de 2016 e início do ano de 2017, a maioria das universidades não estavam, ainda, cientes da nova portaria normativa. Com isto, a Compassiva começou a auxiliar as próprias universidades a confeccionarem a resolução interna de revalidação de diplomas, com base na Portaria do MEC no 22.
Outro grande problema, enfrentado em 2016 e 2017, foi a adesão em massa das universidades públicas do Brasil a uma greve nacional. Nas universidades em que possuíamos um bom relacionamento e um ponto focal, mesmo com a greve conseguimos dar continuidade ao andamento dos processos e iniciar outros, entretanto nas universidades que não possuíamos tal vínculo, não foi iniciado nenhum processo de revalidação, pois nos deparávamos com a falta de funcionários.
Porém, em meio a tais empecilhos, ainda em 2017, a Compassiva e o ACNUR, em parceria com o deputado federal Carlos Bezerra Junior, puderam criar a primeira lei estadual que concedia isenção ao pagamento de taxas de revalidação de diplomas de graduação para refugiados nas universidades do Estado de São Paulo. O êxito da Lei 16.685/2017 – Estado de São Paulo possibilitou que ela fosse replicada no Estado do Rio de Janeiro (Lei 8.020/2018) e ainda, posteriormente no Estado do Paraná (Lei 19.830/2019). A Lei do Estado do Paraná é a única a garantir a isenção para refugiados e também aos imigrantes em situação de vulnerabilidade, solicitantes de refúgio, refugiados e apátridas.
No ano de 2018 percebemos um grande fluxo migratório de venezuelanos no Brasil e muitos deles possuíam ensino superior completo, entretanto não possuíam o status migratório de refúgio. Mapeamos as universidades no Brasil que fizessem a revalidação do diploma de venezuelanos e nos deparamos com a realidade de que nenhuma universidade aceitaria fazer a revalidação do diploma de um imigrante que não possuísse toda a documentação obrigatória ou que não fosse um refugiado reconhecido pelo CONARE – em geral, as universidades sequer aceitavam protocolar tal pedido de revalidação de diploma.
Assim, a Compassiva iniciou um árduo trabalho de advocacy junto às universidades e, em 2019, conseguiu que 2 universidades fizessem o processo de revalidação de diploma de venezuelanos no Brasil, ainda que eles não tivessem toda a documentação obrigatória – o que é a realidade da maioria dos venezuelanos -, bem como tivessem o processo facilitado, como para os refugiados reconhecidos no país, ainda que não tivessem o status migratório de refúgio. Algum tempo depois, outras duas universidades parceiras também começaram a revalidar diplomas de venezuelanos. E foi no final do ano de 2019 que tivemos os dois primeiros diplomas de venezuelanos revalidados no Brasil, através do nosso projeto de revalidação de diplomas. Atualmente, cerca de 12 universidades em todo Brasil atendem venezuelanos estendendo as facilitações de revalidação de diploma garantida a refugiados reconhecidos pelo CONARE.
Porém, em 2020, o projeto de revalidação de diplomas precisou passar por algumas alterações, devido à pandemia do novo corona vírus. Uma das primeiras alterações foi a respeito dos atendimentos que antes eram presenciais e ao longo do ano passaram a ser atendimentos apenas online.
Para saber mais como foi o ano de 2020, acompanhe nossa próxima matéria e saiba como conseguimos enfrentar um ano repleto de dificuldades e crises, mas por meio da esperança conseguimos forças para continuar sendo refúgio na vida de milhares de pessoas.