Na Compassiva, desde 2014, começamos a ministrar aulas de português gratuitas para refugiados sírios e palestinos em nossa sede – começamos com uma turma bem pequena, eram ao todo 6 pessoas.
O tempo passou e a turma foi crescendo. As aulas alcançaram outras fronteiras da cultura árabe: Egito, Marrocos, Iêmen, Irã, Iraque, etc, além de beneficiarmos até 80 alunos e alunas semanalmente.
Em 2015, quando uma das nossas professoras voluntárias de português, Camila Suemi Tardin, estava conversando com um aluno, descobriu que este buscava revalidar seu diploma, mas com imensa dificuldade para entender todo o processo devido à burocracia. Por ser advogada, ela ofereceu ajuda e, assim, a Compassiva percebeu que poderia contribuir com o processo de revalidação de outras pessoas em situação de refúgio.
Desde então, firmamos uma parceria com o ACNUR (Agência da ONU para Refugiados) e de maneira estruturada iniciamos o projeto de revalidação de diplomas de graduação para refugiados reconhecidos pelo CONARE, que permite interpor os pedidos junto às universidades públicas em todo o território nacional de maneira gratuita.
Recomeçar não é fácil! Envolve perdas físicas, mas também emocionais. E a revalidação do diploma de graduação muitas vezes é esse fôlego em meio a tanta mudança repentina – de integração e de pertencimento.
‘Não é apenas um pedaço de papel’, diz André Leitão, presidente executivo da Compassiva. ‘Revalidar o diploma é o primeiro passo para que essas pessoas possam recuperar a sua dignidade, sua identidade’.
Atualmente a Compassiva deu entrada em mais de 100 processos e revalidou cerca de 30 diplomas de refugiados de diversos países, inclusive Síria, Palestina, República Democrática do Congo, Venezuela, Colômbia, Nigéria, Moçambique, Irã, apátrida.
Neste mês de abril, a Rede Globo começou a exibir a novela Órfãos da Terra. A trama narra a história de pessoas que fugiram de um conflito, que já dura 8 anos na Síria (confira nossa primeira postagem da série falando sobre o conflito aqui).
Essa é a realidade do refugiado que tenta revalidar seu diploma no Brasil!! Linda cena! Muito orgulho desta novela! ✊🏽🌹 pic.twitter.com/MfZfCEUwLv
— Renato Góes (@renatogoess) April 15, 2019
Na segunda-feira passada (15), a trama iniciou a saga do médico Faruq Murad, interpretado por Eduardo Mossri, que busca revalidar seu diploma de Medicina aqui no Brasil e começa a enfrentar os diversos obstáculos.
Desejamos e trabalhamos para que, nesse caso, a ficção não vire realidade, pois já iniciamos 3 processos de revalidação de diploma de Medicina, um cubano e dois venezuelanos. Há uma grande busca de pessoas para revalidar o diploma de Medicina no Brasil. Atendemos pelo menos 10 pessoas de várias nacionalidades que têm interesse em começar este processo.
A revalidação de qualquer diploma é um processo muito burocrático e oneroso, e é particularmente difícil revalidar o diploma de Medicina. Por isso dispomos de uma equipe jurídica, que pode aliviar o fardo, buscando servir às pessoas que deste serviço necessitem. Começamos em 2019, ainda em parceria com o ACNUR, a ajudar no processo de revalidar diplomas de Medicina especificamente.
O sistema de revalidação do INEP, o Revalida, acontece mediante publicação de edital para convocação de inscrição dos interessados, que deverão ser aprovados em prova objetiva e prática como condicional para revalidar o diploma de Medicina. Entretanto, não houve em 2018 publicação de edital e não há indícios de que haja em 2019. Além disso, a maioria das universidades aderiu ao Revalida – as duas que decidiram permanecer com o processo administrativo possuem uma fila de espera de aproximadamente 300 pessoas.
Esta realidade atinge não somente aos refugiados: também solicitantes de refúgio, apátridas, residentes temporários, imigrantes em situação de alta vulnerabilidade, bem como brasileiros que fizeram seus estudos fora – até mesmo em universidades renomadas como Harvard ou Oxford – e querem voltar para o Brasil para exercer sua profissão, mas não podem atuar na sua área de formação.
A Camila Suemi Tardin, advogada da Compassiva, comenta: “Acredito que o país e a população brasileira tenham muito a ganhar com a atuação desses médicos e que seja ruim para o Brasil a perda dessas potencialidades, tanto na atuação profissional quanto na área de pesquisa.”
Que possamos reverter a infeliz realidade que inspira a ficção na novela Orfãos da Terra: tornando possível o exercício da medicina por médicos refugiados, além de todas as outras profissões.
Que o Brasil possa ser um país mais acolhedor para estes profissionais médicos, e que estas pessoas possam servir à sociedade brasileira com suas habilidades.
Junte-se a nós e seja também um agente de acolhimento para refugiados em solo brasileiro, doando aqui.